25 de fevereiro de 2005

sem pipocas

algumas memórias são assim: um ciclo de cinema no tagv, em 1979 ou 80, naquela noite passava a quimera do ouro, e o meu pai teve uma ideia: levou-me a mim e ao meu irmão mais velho a ver o filme. nessa noite chovia muito, como não chove agora, a minha irmã ficou com a minha mãe, contrariada, não devia ter mais de cinco ou seis anos, e nós, sem automóvel, tínhamos de ir a pé. os três debaixo de um chapéu-de-chuva preto, o meu pai ao meio, a segura-lo, e a gerir a nossa defesa. subimos a ladeira do seminário, ao tempo ainda com calçada, e lá fomos fustigados pela água e pelo vento, nós e as arvores de jardim botânico, até ao cinema: mostrar o bilhete, ocupar o lugar, ver a luz apagar-se. aquela aventura de ir a pé, debaixo de uma intempérie, ao cinema ver o charlot ficou gravada na minha memória, mais do que o filme, ainda sinto as botas molhadas e o orgulho de ter participado em algo. foi uma iniciação a estes estranhos hábitos de sair de casa para ver ou ouvir algo bonito, sem pipocas.

3 comentários:

Anónimo disse...

cá para mim estás a ficar choné

Bruno Ministro disse...

ai eu quero a ladeira do seminário.

Anónimo disse...

Eu quero voltar à casa amarela da travessa da ladeira do seminário... e encontrar tudo como me lembro, tudo no sítio, dentro do meu quarto... as minhas mulas, os mulos e os nossos gatos...